"Não se descuide de ser alegre - só a alegria dá alma e luz à Ironia, à Santa Ironia - que sem ela não é mais que uma amargura vazia." - Eça de Queiroz

sábado, 20 de janeiro de 2018

Calcaida (por Pedro Maia)




Era uma vez, numa terra no meio do oriente,
Onde os homens escravizavam as mulheres,
E as crianças aprendiam a rebentar bombas,
Houve um grupo de pessoas que decidiu formar um grupo.
Esse grupo queria, fundamentalmente, andar à bulha
Com quem lhes aparecesse em frente,
Com uma desculpa religiosa qualquer
Que não vem em livro algum dessa estirpe.
A partir daí foram aparecendo outros grupos
Da mesma categoria que este com o grande objetivo
De aparecer nas televisões por esse mundo fora
De ser notícia, por terem feito uma palermice qualquer
Metendo medo a qualquer pessoa.
Ai vida à minha, que fiz eu para aturar esta gente
Que só pensa em barbaridades penosas a qualquer alma penada.

Poema Para Ti (por Bruno Teixeira)




Escrevo um poema para ti,
numa manhã de primavera
em que os rouxinóis cantam
e as fragatas navegam nas
águas de um rio renascido.
Escrevo um poema para ti,
doce melodia da existência,
doce encanto da mocidade
que canta o fulgor d’um
poeta, essa criatura
fingidora e pedante.
E estes versos, puras odes
de um coração imaturo que
aprendeu a amar com um
manual de instruções de
um videojogo criado no Japão.
E estas palavras, amargas
oitavas corroboradas por um
vento que sopra as nossas memórias,
as nossas lembranças de um
mundo perfeito que agora está perdido.
Que tudo isto entre no teu
olhar com a sonoridade de um canto,
como uma serenata cantada por um
trovador à sua amada nas
ruas de euforia que ele viu passar.
E esse trovador sou eu
escrevendo este poema para ti.

Abri os Olhos com Vontade (por Carolina Lopes)





Abri os olhos sem vontade, já o sol brilhava alto no céu, iluminando-me com os seus raios através da janela. O corpo ainda não respondia convenientemente aos meus comandos, a mente percorria todos os acontecimentos passados num frenesim, tentando assimilá-los, dar-lhes um sentido. Continuei deitada no chão da sala.


Os azulejos estavam frios, mas esse tipo de sensações já me tinham ultrapassado. Não sentia nada, a não ser uma dor imensa, uma sombra negra e sufocante que me envolvia. Abracei-me a mim mesma, numa tentativa desesperada de manter o peito intacto, que teimava em desfazer-se a cada memória da noite anterior.


Olhei em volta, pedaços do meu coração espalhavam-se como estilhaços de um espelho partido, e em todos eles podia ver o teu rosto, e nele, a expressão com que me tinhas deixado há umas horas. Pareciam agora dias, semanas, desde esse momento, o instante em que disseste finalmente que não me querias mais, o instante em que desististe de me amar.


Tudo deixou de fazer sentido nesse momento, o meu mundo desabou sob mim, deixaste-me sem propósito, destroçada, de joelhos nestes azulejos. Como eram perversas as memórias. Como eram atrozes e bárbaros os espinhos que se cravavam no meu peito. Mas eram tranquilizantes essas mágoas, asseguravam-me que não te imaginara, que tinhas sido real na minha vida, que em determinado tempo fui tua, embora nunca te possa ter considerado meu.


Era feliz a amar-te, era feliz a fazer de ti a minha vida, era feliz a fazer girar em ti o meu mundo. A mesma vida e o mesmo mundo que agora tinham desaparecido. Apenas restava esta sala, este chão, e os raios de sol que me expunham. Deixaste-me para sempre, mas não sem antes me despedaçares impiedosamente.


Faltam-me partes, sinto-me incompleta. Fragmentei-me aos pés de quem não me merecia. Entreguei-te o meu coração e a minha alma, sem qualquer hesitação. Agradeceste, guardaste-os e esqueceste que existiam. Esqueceste que eram tua responsabilidade, que tos cedera para cuidar, e deixaste-os abandonados. Agora que mos devolveste estão frágeis, debilitados por ter aberto mão deles tão facilmente, e a quem nunca os quis.


Gostava de poder chorar, as lágrimas têm o dom de aliviar a dor, deixando-a sair por entre o seu sal. Mas nem isso me resta. Os meus olhos estão secos pela amargura. Esgotei todo o meu pranto na ilusão de que ficarias. Agora apenas fixam a porta por onde saíste, o vazio que deixaste.


Hoje vou continuar deitada, mas amanhã hei-de levantar-me, juntar todos os pedaços de mim e sair desta casa. Hão-de voltar ao seu lugar, e apagar-te da sua memória, ficando apenas a profunda cicatriz para me relembrar que o lugar deles é em mim e não esquecidos na gaveta de alguém.

A Vida Real é Irrealista (por Pedro Maia)




A vida real é irrealista,
Tão irrealista ao ponto de te dar a entender que é real;
Tudo o que tu vês à frente é surreal, nada disto existe,
Tudo o que vês é um projeto que provém da tua mente.
Toda esta logística provém do teu imaginário,
Das tuas ilusões sobre uma vida recheada de tudo,
Mas que, no fundo, não representa nada… nada de todo.
Tudo o que conhecemos não é real, mas sim irrealista.
Olha para os animais, para as plantas, para as bactérias,
Observa todos os seres vivos deste planeta e diz-me o que vês.
afinal de contas, qual é o objetivo deles?
Será viver a sua vida segundo a sua natureza?
E nós humanos? O que somos?
Nós destruímos aquilo que pertence aos outros por direito,
Aquilo que inequivocamente pertence à Natureza.
Somos uma cambada de pétreos.

Pensamentos Soltos (Revisited) (por Bruno Teixeira)




Dos olhos negros d’uma criança
sai um olhar desconsolado,
uma alma desencantada,
um coração velho e cansado.
No puro encanto da inocência,
olha p’ra mim bem sorridente
e o canto da sua jovialidade
cai sobre meu sorriso dormente.
Do sorriso leve d’uma criança
saem palavras que tocam
na alma dos que sonham,
dos que pensam, dos que choram.
No puro encanto da inocência,
olha p’ra mim bem sorridente
e o canto da sua jovialidade
cai sobre meu sorriso dormente.
E as palavras daquela mocidade
pairam sobre ideais floridos,
pensamentos soltos que cantam
sobre aqueles choros sentidos.
Se pudesse ao menos sentir
toda aquela alegria;
se pudesse ao menos sentir
toda aquela sinfonia.
Do encanto d’uma criança
saem visões d’um espelho meu
e naquela doce alma encantada
vejo que aquele sorriso é meu.
E no puro encanto da inocência,
olha p’ra mim bem sorridente
e o canto da sua jovialidade
cai sobre meu sorriso dormente.

O Dia de Todos os Santos (por Bruno Teixeira)




O dia em que os santos desceram à Terra
Nem Deus nem o Diabo o lembram
Por entre as penumbras no alto da serra;
Não o lembram por entre as memórias
De algo pelo qual nem sequer esperam.
O dia em que os santos desceram à Terra
Das nuvens com suas auréolas douradas,
Não o lembram por entre a paz e a guerra
Os homens, as mulheres e seus devaneios
Repletos de misteriosos contos de fadas.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Nostalgia (por Bruno Teixeira)



Vai-se o tempo
E vêm as memórias,
Ficam as imagens
Que o tempo não levou;
E suas histórias
Nem o tempo que não volta
Consegue lembrar.
E o tempo, esse ditador
Das leis das perceções,
Faz o Homem chorar
Sobre o túmulo das ilusões
Que ele próprio amou.
E o tempo que não volta
Do seu requintado exílio
Jamais consegue lembrar
Suas aventuras joviais
E suas loucuras banais.
Ó deuses olímpicos,
Ó vós que sois a idealidade,
A raiva dos hecatonquiros,
Que fazeis vós no concílio
Consumindo a vossa eternidade?

Alma (por Carolina Lopes)





Como é difícil expor a alma, dar a conhecer o nosso ser, abrir o nosso mundo. Dizem que é mais fácil fazê-lo com estranhos do que com conhecidos. Concordo! Revelarmo-nos a alguém que não nos conhece retira toda a pressão do julgamento alheio. É claro que todos julgam, mas o julgar de um estranho não nos assusta tanto como os olhares dos conhecidos.
No meu caso é sempre difícil expor a minha alma, levantar o véu dos meus pensamentos. Não gosto de abrir as minhas janelas ao resto do mundo, há vezes em que as abro a estranhos e alguns conhecidos próximos, mas fecham-se logo a seguir com ventos de tempestade.
Sou uma crítica de mim mesma, mantenho conversas infinitas com a minha alma. Anulo-me nas minhas próprias ideias e observações, agraciando-as com cinismo e descrença. Tenho tanto para dizer, mas abrindo a boca para falar sinto que tudo já foi dito cá dentro. Dito, ouvido, analisado, criticado e respondido. Não resta nada para os outros, tudo é guardado para mim. Coisas boas e más amontoam-se-me na alma, escorrendo por vezes em direcção ao coração, atingindo-o com um aperto desmedido, sufocando-me, agitando as águas dentro de mim, que se escapam depois pelos meus olhos.
Deixar correr pela tinta da caneta as palavas que me povoam a mente é agradável, mas não acreditem em mim. Minto e hei-de mentir, hei-de enganar com frases e gestos inocentes, capazes de convencer os menos experientes e causar apenas breves dúvidas nos mais conhecedores.
Minto porque posso. Enquanto a minha alma grita por liberdade, finjo e iludo para quem me vê e ouve. Mentir é mais fácil, traz menos complicações. Angústias da alma e lágrimas penosas trazem perturbações e desconforto, sorrisos acalmam e não acarretam remorsos.
Engane-se quem ler este texto que vos exponho algo de mim. Isto toda a gente sabe, mas quase nenhuns reconhecem. Somos mais felizes no mundo das aparências e fazemos tudo para lá permanecer.

Perfume de Rosas (por Joana Montenegro)





No íntimo dos idealistas permanece uma vontade de irreverência,
De imaginar o mundo como um perfume de rosas,
E não a maledicência, a crueldade que envolve a realidade,
Um facto que perdura desde a Antiguidade, desde os passados remotos.
A pose da idealidade sob o céu pincelado em tons de azul,
Refletida através do sol, irradiando júbilo, através dos seus olhos vaporosos,
Transmite uma sensação de tranquilidade, de paz,
Em que a existência é o moinho dos mares por descobrir.
Os visionários do mundo, os mecanismos constantes de ideias,
Inflamados pela emoção da sua vocação, descrevendo os seus feitos,
Destacam a grandiosidade da vida, audaciosos pelo reconhecimento.
O idealismo, mais que uma forma intrínseca de viver,
É a calçada dos trilhos repletos de felicidade
E uma ilusão exacerbada, prejudicando a racionalidade destes deambulantes.

Ode aos soviéticos (por Bruno Teixeira)




Homens lutando na rua,
mulheres servindo a pátria,
crianças cantando ao luar
trovas e sonetos de encantar.
Corações ao rubro, armas ao alto,
o povo que carrega uma nação;
flores nas mãos, bandeiras ao vento,
cai o déspota, triunfa a revolução.
O calor que move a multidão
por entre o ardor d’uma frígida cidade,
o sangue que move suas emoções
por entre o espírito de fraternidade.
Corações ao rubro, armas ao alto,
o povo que carrega uma nação;
flores nas mãos, bandeiras ao vento,
cai o déspota, triunfa a revolução.
Cânticos, esparsas e madrigais,
redondilhas e métricas desiguais,
a revolta das sepulturas,
o fim dos negreiros e das escravaturas.
Odes que cantam a mudança,
ventos que sopram contra a maré,
poetas que cantam a esperança,
o som dos sinos que tocam na sé.
Corações ao rubro, armas ao alto,
o povo que carrega uma nação;
flores nas mãos, bandeiras ao vento,
cai o déspota, triunfa a revolução.